Quanto mais nos debruçamos sobre as causas das doenças mentais e todo o sofrimento associado a elas, percebemos que o olhar deve ser amplo e integrado. Se para alguns, depressão e transtornos de ansiedade ainda é tabu, exagero, preguiça ou ingratidão, para quem está atento e atualizado, é cada vez mais certo que são vários os fatores relacionados ao desenvolvimento de doenças mentais e a saúde do meio ambiente é um deles.
Os efeitos da poluição do ar na saúde física, como por exemplo, no sistema cardiovascular e respiratório, já estão bem estabelecidos, mas quando se trata da saúde mental, muito ainda se tem que avançar, já que é uma área de pesquisa mais recente.
A poluição, com suas diversas facetas como poluição visual, sonora, luminosa, térmica, hídrica e atmosférica têm sido cada vez mais associada a ocorrência de distúrbios mentais, mostrando que o meio ambiente saudável é um ingrediente chave para nossa saúde e bem-estar.
Uma pesquisa realizada na Coréia, avaliou 2320 casos de atendimento emergencial por ataques de pânico entre 2005 e 2009 e indicou que dentre os poluentes estudados, a concentração de ozônio (O3) no ambiente está significativamente associada a esses atendimentos de emergência, sendo que indivíduos com menos de 40 anos de idade e mulheres apresentaram significativamente maior risco para esse quadro. Além disso, das quatro estações do ano, apenas o verão mostrou um risco significativamente aumentado.
Em 2022, um Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontou para o aumento esperado nos impactos da saúde mental devido à exposição a altas temperaturas, eventos climáticos extremos, perdas econômicas e sociais relacionadas ao clima, bem como ansiedade e angústia associadas a preocupações crescentes com a crise climática.
Outro estudo longitudinal realizado nos Estados Unidos, procurou uma conexão direta entre o ar poluído e a saúde mental, contando com cerca de 6.000 entrevistados. Os pesquisadores fundiram um banco de dados de poluição do ar com registros correspondentes aos bairros de cada um dos participantes da pesquisa se concentrando nas medições de partículas finas que são produzidas por motores de automóveis, lareiras, fogões a lenha e usinas movidas a carvão ou gás natural.
Essas partículas finas possuem menos de 2,5 micrômetros de diâmetro e são facilmente inaladas caindo na corrente sanguínea. Para se ter uma ideia, um fio de cabelo humano médio tem 70 micrômetros de diâmetro, por isso, esse material particulado fino é considerado de maior risco do que as partículas maiores.
Os pesquisadores avaliaram os sentimentos de tristeza, nervosismo, desesperança e afins e descobriram que o risco de sofrimento psicológico aumentou juntamente com a quantidade de partículas finas no ar. Por exemplo, em áreas com altos níveis de poluição (21 microgramas por metro cúbico), as pontuações de sofrimento psicológico foram 17% maiores do que em áreas com baixos níveis de poluição (5 microgramas por metro cúbico). O padrão de segurança atual para partículas finas, de acordo com a Agência de Proteção Ambiental dos EUA, é de 12 microgramas por metro cúbico.
Estudos relacionando a saúde mental com a alta concentração de poluentes atmosféricos como NO2, CO, SO2, O3, materiais particulados, entre outros, têm indicado que o impacto da poluição na saúde mental depende de fatores como etnia, gênero, idade, doenças pré-existentes, entre outros. Esses múltiplos fatores, faz com que mesmo níveis moderados de poluentes podem ser prejudiciais à saúde a depender do indivíduo e contexto em que vive.
Ainda falta muito para a compreensão do impacto da poluição na saúde mental e bem-estar, mas o conhecimento atual é suficiente para agir!
A poluição ambiental é um problema de saúde pública com uma solução clara e acionável desde que conduzida com vontade política para regulação e fiscalização da qualidade do ar.
Tais estudos sugerem que os esforços de saúde pública para reduzir os custos pessoais e sociais da doença mental devem considerar não apenas as características individuais e sociais, mas também as facetas pouco exploradas do ambiente físico como a poluição.
Nesse cenário, é importante combater a poluição causada pelas indústrias, agricultura, principais meios de transporte, falta de gestão de resíduos residenciais e melhorar a gestão da qualidade do ar através da adoção e cumprimento de bons padrões de qualidade.
Para além da luta por ações governamentais e privadas concretas para a solução da poluição ambiental, nosso papel aqui é divulgar e incentivar formas naturais de melhorar a saúde mental e mitigar os efeitos adversos da poluição.
A primeira forma é a abertura para falar sobre o assunto. Doenças mentais não podem ser um tabu e deve ser cada vez mais de conhecimento público os inúmeros fatores que culminam em doenças como depressão e ansiedade. O debate abre espaço para inclusão, para apoio familiar, para busca por ajuda e para melhor preparação dos profissionais da saúde.
Também podemos e devemos nos envolver na luta pela qualidade do ar próximo nossas casas, bairros, condomínios, etc. O plantio de vegetação em ambientes urbanos tem múltiplos efeitos na poluição. Cinturões de árvores, arbustos, paredes e telhados verdes têm efeitos visuais positivos, absorvem a energia acústica, reduzindo o ruído do trânsito, de obras, das indústrias e, além disso, ajudam a amplificar os sons naturais atraindo a vida selvagem urbana.
Para além da qualidade inquestionável do ar próximo a ambientes naturais, os sons da natureza trazem benefícios à saúde, pois podem sinalizar um ambiente seguro e reduzir a ansiedade. E o contato frequente com o verde diminui processos inflamatórios acionados pela poluição.
O olhar cuidadoso para nossa alimentação é imprescindível. Fornecer ao nosso organismo os nutrientes e fitoquímicos como antioxidades e antiinflamatorios pode fazer a diferença tanto no surgimento quanto no cuidado das doenças mentais cada vez mais associadas a inflamação crônica.
Uma vez que as causas são variadas, o cuidado também o é. Que possamos intensificar a luta pelo meio ambiente saudável! Que possamos nos aproximar daquelas pessoas conhecidas em nossas cidades por trabalhar com a terra, plantar, colher e distribuir alimento de qualidade e soluções naturais! Que possamos colocar comida de verdade em nossos pratos! E que possamos divulgar técnicas, ideias e maneiras de tornar nossa vida e a vida do próximo mais leve e saudável.
Referências:
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Sass, V., Kravitz-Wirtz, N., Karceski, S. M., Hajat, A., Crowder, K., & Takeuchi, D. (2017). The effects of air pollution on individual psychological distress. Health & place, 48, 72-79.
World Health Organization 2022. Mental health and climate change: policy brief. ISBN 978-92-4-004512-5 (electronic version).